terça-feira, 16 de outubro de 2007

divagar...


Tudo o que sou não é mais do que abismo
Em que uma vaga luz
Com que sei que sou eu, e nisto cismo,
Obscura me conduz.

Um intervalo entre não-ser e ser
Feito de eu ter lugar
Como o pó, que se vê o vento erguer,
Vive de ele o mostrar.

Fernando Pessoa




A luz espreitava sobre os ramos fortes das àrvores que se erguiam agasalhando o alcatrão negro... o seu brilho embalava recordações da inconstância que sou... Percebi nesse momento que pertencia ao deserto... a aridez não vem da escassez da àgua mas da abundância das lágrimas... repousei cuidadosamente a minha alma sobre as memórias, deixei-me conduzir pelos contornos das areias...

Renascer... tal como a natureza em cada morno outono... despedir-me do intenso braseiro que se prolonga nas sombras dos dias de verão e aninhar-me na ternura do ténue raio de sol... reparar no corar das àrvores... nos segredos que guardam em ninhos que ficaram esquecidos...

Repousar o olhar nos campos ainda verdes... prosseguir o caminho abandonado... o pensamento na luz que paira no ar... a alma abandona-se na poeira que flutua.. bebe do silêncio... da ausência...

Procuro a paz... recolher o meu íntimo e segredar-lhe a minha verdade... procuro a sinfonia desta luz que passa nas copas das árvores e se refugia nas sombras do chão...

Eu sei que não sou... e o que sou não me pertence... e é daqui que vem a minha mágoa... a minha dor... porque o abismo que encarno não é mais que as ausências da minha verdade...

Desconheço-me a fronte... não me reconheço neste reflexo... suspiro sofregamente a possibilidade do vazio.. do nada que me invade o corpo e me seca a carne, enrola a língua e queima o ar...

A cinza no rosto é o prolongamento do beijo... é a verdade mentida, vertida sobre o caminho que passou... A paz... a luz branca que amarelece as folhas e embaraça a Terra... a paz... o respirar silencioso sobre a carne separada... a luz sobre a carne... a sombra sobre o rosto... soluço do peito... debruçar da alma... esperar na luz... que prolonga o olhar...


Um comentário:

Anônimo disse...

ola
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